BITUCAS

- Por Frank -


Ela deu uma última tragada.

Uma multidão subia pela escada do ônibus, enquanto ela tragava toda a nicotina que podia, como se aquele cigarro fosse o último de sua vida; em seguida, jogou a bituca longe e sumiu dentro do ônibus, em meio a uma cortina de fumaça que seu pulmão exalara.
Não sei o que houve com a moça nem se aquela foi a sua última tragada; mas sei que fim levou a sua bituca de cigarro. Àquela mesma tarde, na mesma rua onde a vi entrar no ônibus, assisti pela TV, a esgotos entupidos transformarem ruas em rios; gente em peixe.

Culpam São Pedro, culpam o prefeito; mal desconfiam que alguns dos verdadeiros culpados foram os donos das bitucas, das latinhas, dos papéis de bala, dos jornais usados e das sacolas de plástico descartáveis que voam pela janela e entopem bueiros e fazem cair as lágrimas dos olhos de quem perdeu tudo, em mais uma enchente de verão na cidade grande.


São Paulo, 12 de setembro de 2005.

- Nota de Wagner Borges: Frank é o pseudônimo do nosso amigo Francisco, participante do grupo de estudos do IPPB e da lista Voadores. Depois de vários anos morando em Londres, ele voltou a residir em São Paulo, em fevereiro de 2005. Ele escreve textos muito inspirados e nos autorizou a postagem desses escritos. Há diversos textos dele postados em sua coluna da revista on line de nosso site e em nossa seção de textos periódicos, em meio aos diversos textos já enviados anteriormente. www.ippb.org.br

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