A PROJEÇÃO E A BUSCA PELA LUCIDEZ

- Por Luiz Fernando Mingrone (Enki) -

Um dos pontos mais buscados dentro do estudo da projeção da consciência é a lucidez extrafísica.

A Projeção da consciência é caracterizada pela presença de três estados distintos de lucidez consciencial. São eles:

a) Inconsciência ou total falta de lucidez - No estado de inconsciência, geralmente, "dormimos" acima do corpo físico, ficando preso à cúpula de energia que envolve e protege o corpo físico durante a projeção. No entanto, em alguns casos, nosso corpo espiritual pode se dirigir ao local, pessoa ou egrégora (atmosfera psíquica) em que estávamos sintonizados nos momentos anteriores ao sono. É possível para o projetor consciente ver o corpo perispiritual (psocossoma, corpo astral) de encarnados flutuando à deriva.

b) Semiconsciência ou lampejos de lucidez - É caracterizado pela retomada esporádica da lucidez. Em muitos casos, um estado de torpor toma conta do projetor e esse não consegue identificar com clareza o que acontece com ele, como se estivesse embriagado. O processo de saída ou volta ao corpo nem sempre é percebido. Geralmente retomamos a lucidez no meio da projeção.

c) Consciência ou lucidez: O estado de total lucidez é caracterizado pelo total controle dos processos projetivos pelo praticante, onde esse interage "conscientemente" com o meio onde se encontra projetado.
Mas o que é lucidez realmente?

O que é estar lúcido?

De maneira geral chamamos de lucidez o estado mental onde percebemos a nós mesmos e o ambiente ao redor e interagimos com os objetos exteriores à nossa mente. É quando o senso de "EU" está presente e ativo.

Esse sentido de Eu ou Ego é o principal agente na obtenção da lucidez, seja ela física ou extrafísica, pois ele é o intermediário entre as percepções captadas pelos órgãos dos sentidos, levando-as ao contato com o princípio inteligente que interpreta essas percepções, transformando-as em sensações.

Portanto, é importante ter a certeza de que o Ego, muitas vezes criticado pelas correntes espiritualistas, é extremamente importante para o crescimento espiritual, pois se usado corretamente pode se transformar em aliado poderosíssimo.

Ramakrishna, sábio hindu que viveu no século XIX, costumava dizer que se ainda não era possível aniquilar o senso de Eu, que seria interessante usá-lo ao nosso favor.

Mas como fazer isso?

De maneira a analisar o nosso Eu, nós temos que começar analisando os objetos dos sentidos e a suas relações com o corpo material.

Nós possuímos cinco sentidos de percepção mais a mente que processa essas informações. Esses cinco sentidos são portas pelas quais nosso ego individual entra em contato com o mundo exterior.

Através das vibrações recebidas pelos objetos exteriores é que construímos a nossa realidade.

Tomaremos como exemplo a percepção das cores.

Através dessas vibrações nós vemos cores diferentes nos objetos e a visão dessas cores vem através de vibrações especificas que entram em contato com os nossos globos oculares e é através dos globos oculares que essas vibrações são focadas, e então é produzida uma imagem invertida nas retinas.

Nós não estamos cientes dessa imagem invertida, mas essa imagem invertida, seja de uma cadeira ou de qualquer outra coisa, produz certas mudanças nos nervos óticos. As vibrações captadas pelos nervos óticos são levadas pelas células do cérebro e uma nova mudança ocorre, e essa mesma vibração é traduzida pelo Ego em sensações. Ego é o agente do princípio inteligente, da Consciência ou Em Si do ser.

Se essas vibrações não forem traduzidas em sensações por um princípio consciente, elas permanecerão apenas como vibrações.

As que são traduzidas como percepções se transformam em sensações e outro processo mental se desenrola e essas percepções serão transformadas ou convertidas em conceitos.

Sendo assim, se eu fechar meus olhos e pensar em uma cadeira, estarei desenhando uma forma mental da mesma cadeira. Isso é um conceito.

Você tem a forma ou conceito da cadeira, e a chama de cadeira e quando você vê algo semelhante a uma cadeira, você compara isso com o seu conceito de cadeira. Se isso não for semelhante ao seu conceito, você a chama de qualquer outra coisa. Esse mesmo processo é usado para formar conceitos sonoros (ex.: o som de uma bateria, de um carro, de um rojão etc.)

Mas essas percepções só se tornarão sensações se houver um princípio inteligente operando nos bastidores.

Um corpo sem vida pode estar com os órgãos dos sentidos em perfeito estado, mas mesmo assim não irá produzir sensações, pois o princípio inteligente já não está mais presente.

Esse processo analítico é muito importante para o conhecimento das operações do Eu. Quando nós despertamos para essa análise, tentamos traçar a causa da sensação e, feito isso, estaremos aptos para descobrir o objeto causal das percepções e das sensações. Para isso um novo processo mental se desenrola e a mente tenta traçar a sua causa. Não são os órgãos dos sentidos que tentam traçar a causa, mas sim a mente inteligente.

Então nós projetamos nosso conceito de nossa mente para o exterior e pensamos que alguma coisa produziu a sensação. E assim nós identificamos a cadeira como cadeira. Mas de fato nós nunca vimos uma cadeira.

Isso parece estranho, não é mesmo? A cadeira não existe? Ao que tudo indica, parece que isso é verdade. Nós não podemos ver a cadeira externa e nós apenas podemos ficar conscientes da sensação. Tentarei explicar essas afirmações nas linhas abaixo.

O que vemos é produto de nossa carência emocional.

A Consciência emana a todo instante sentimento em todas as direções.

Essa emanação é fruto da carência de perceber a si mesma.

O primeiro plano onde essa carência se manifesta é o plano mental (lembrando que aglutinamos os sete planos em apenas três). Se nesse plano a minha emanação de sentimento encontra resposta, ela volta à consciência e a mesma se torna mais sábia. Se isso não ocorre, mais energia é empregada e a minha consciência e manifesta no plano astral. O processo se repete e se minha carência não for preenchida, mais energia é empregada e eu me manifesto no plano físico.

Encarnamos para satisfazer nossas carências e, assim, nos tornarmos consciências mais completas, sábias. A manifestação física é baseada na interação dos cinco sentidos e da mente com os objetos com que nos relacionamos. Os nossos sentidos estão captando vibrações dos objetos a todo instante e a nossa relação com esses objetos tem como objetivo nos tornar mais completos, plenos. Quando os nossos sentidos interagem com os objetos uma sensação é produzida e essa sensação deixa uma impressão na nossa mente. Essa impressão nós chamamos de prazer e pode ser dividida em "gosto" e "desgosto".

A impressão deixada fica adormecida, latente até que ela encontre as condições favoráveis para se manifestar novamente. Mas o que buscamos de fato? Qual é o objetivo real de nossas buscas? Felicidade.

Queremos nos sentir, livres, plenos, absolutos, completos. Quando nos relacionamos com um objeto, seja ele uma cadeira, um chocolate ou qualquer outra coisa, buscamos nessas relações a satisfação de nossa carência de ser feliz, pleno. Nesse processo temos a oportunidade de perceber que o prazer, a suposta felicidade originadas dessas relações são efêmeras, logo se esvaem, e rapidamente estaremos transportando nossa busca para outro objeto. Infelizmente, na maioria das vezes, nós não estamos conscientes desse processo.

Nós entramos em contato com muitos objetos, mas só ficamos conscientes de uns poucos. No entanto, todos os objetos com os quais os órgãos dos sentidos entram em contato modificam a mente, deixando impressões, que podem ser subconscientes ou subliminares.

Quando converso com alguém, o meu foco principal de atenção é a pessoa. No entanto, os meus órgãos dos sentidos estão trabalhando em conjunto com a minha mente e me dizendo se a roupa da pessoa me agrada ou não, se a voz dela me agrada ou não, se as cores do ambiente me agradam ou não, se os sons me agradam ou não, e por aí vai.

Todas essas relações são armazenadas na mente e separadas baseadas na relação de gosto e desgosto que temos com elas. Nossa mente é como um lago, onde a superfície representa a relação mente/objeto de forma mais direta. O fundo do lago representa as impressões captadas pela mente e que estão "adormecidas", em sua forma latente. É o que chamamos de subconsciente. Mas algumas vezes a superfície do lago se agita, revolvendo os detritos do fundo do lago, levando-os para a superfície. Da mesma maneira, quando surge um momento propício, informações de nosso subconsciente "sobem" para a mente consciente. Isso ocorre o tempo inteiro e nós nem percebemos.

Por exemplo: nesse exato momento, algumas pessoas que estão lendo esse texto podem estar balançando o pé, ou então, balançando o corpo. Por quê? Porque certa música surge em minha mente de uma hora para outra, "sem mais nem menos"? Qual o estímulo que me levou a balançar o pé ou colocar a mão no queixo? Estou ciente disso? Geralmente não, mas os impulsos existiram e são possíveis de se descobrir com o uso do discernimento.

Esses são exemplos de sensações do subconsciente que se tornam objetos de nossa mente "consciente" sem que percebêssemos o processo. Muitas de nossas ações "conscientes" são, na verdade, frutos de estímulos de nossa mente subconsciente que "vem à tona" na mente consciente. Sabendo desse processo, pergunto: Estamos lúcidos? Não. Temos momentos de lucidez. Tanto dentro como fora de nosso corpo físico.

O estudante espiritualista costuma dividir o Homem em três corpos: o corpo mental, o corpo astral e o corpo físico.

Aceitamos o fato de que o corpo mental é "mais rápido" do que o astral e que o corpo astral é "mais rápido" do que o físico. Pensar (mental) é mais rápido do que sentir (astral), que é mais rápido do que a ação física. A percepção consciencial no nível mental é extremamente difícil, pois as emanações são extremamente sutis. Essas vibrações sofrem uma densificação no plano astral, mas mesmo assim ainda são rápidas para nossa percepção consciencial. A manifestação no plano físico é a mais densa e mais lenta das três, mas ainda é rápida para nossa manifestação consciencial atual.

Todas essas manifestações ocorrem em seus mais variados graus, não sendo algo estático ou pré-definido. Do mental ao astral há infinitas gradações, e do astral ao físico também, pois uma manifestação consciencial nunca é igual à outra. Para ilustrar melhor o que foi dito acima, usaremos o simples exemplo de comprar uma maçã.

No plano mental, se desejo uma maçã, instantaneamente surge uma para mim. Eu fiquei mais sábio com isso? Não, foi tão rápido e eu são tão imaturo que não assimilei o processo, pois ele carecia de algo que eu me identifico muito: emoção. Já no plano astral, com um pouco de concentração a maçã se forma em minhas mãos. Isso requer mais tempo que a manifestação mental, mas mesmo assim é muito rápido se comparado ao plano físico. Fiquei mais sábio com essa manifestação astral? De maneira geral posso dizer que não. A experiência ainda é muito rápida e eu, imaturo que sou, não compreendi os processos. Percebo apenas um traço da experiência, pois já há a emoção presente no processo.

No plano físico, para eu ter a maçã eu preciso comprá-la (na maioria das vezes. Mas esse exemplo também serve para aquele que apanha a maçã da árvore). Para comprá-la eu preciso de dinheiro. Para ter o dinheiro eu preciso trabalhar, para trabalhar preciso de uma profissão, para exercer a profissão preciso de uma qualificação, para ser qualificado preciso ter estudado, e por aí vai. A quantidade de ações que eu tive que desenvolver para poder ter a maçã me colocaram em diversas experiências e são essas experiências que podem me deixar mais sábio. No entanto, nem sempre nos tornamos mais sábios. Por quê? A interação com a maçã produz em nós uma modificação emocional (o prazer - gosto e desgosto) e essa identificação emocional é tão forte que tolhe a percepção direta da Consciência.

Será que o plano físico é muito rápido para nós? Parece que sim. Se não o é, por que repetimos os mesmos erros várias vezes? Por falta de atenção nessas interações e pelo nosso descontrole emocional (parecemos macacos indo de galho em galho ou desejo a desejo) estamos cada vez mais enraizados no ciclo reencarnatório.

O nosso corpo astral é a sede de nossas emoções, portanto o controle emocional é uma das chaves para a lucidez. Entendendo as nossas relações com os objetos (e no nosso estudo tudo é objeto e nós somos o sujeito), estaremos nos tornando cada vez mais lúcidos, despertos e essa lucidez se refletirá fora do corpo físico. O que me adianta buscar a lucidez astral se não consigo controlar a minha raivinha durante o trânsito da cidade?

O nosso corpo físico funciona como um freio, pois ele nos permite perceber as emanações emocionais com mais clareza. Mesmo não dando muita importância para elas ou não a percebamos, elas existem. E são essas variações emocionais que causam a falta de lucidez, seja ela física ou extrafísica. O que somos aqui não é diferente do que somos fora do corpo. Somos um só. No entanto, os meios onde me manifesto são diferentes. O corpo físico obedece a leis naturais específicas do plano material e o corpo astral obedece às leis naturais específicas do plano astral. Nada é místico ou esotérico, mas sim natural e passível de investigação, entendimento e controle.

Sair do corpo não é privilegio ou dom. É um processo natural que envolve muita responsabilidade, assim como estar no corpo. A busca pela lucidez não é (ou não deveria ser) uma exclusividade dos projetores ou estudiosos da projeção astral. Ela é a chave para o processo de iluminação, de despertar. Nossa felicidade não está condicionada a uma mudança de plano. O paraíso é portátil, está dentro de cada um de nós. O inferno também, se assim quisermos.

Estar encarnado é oportunidade de experiência, de crescer e ter a chance de compreender os processos da Existência. Dentro ou fora do corpo o importante e estar lúcido, e a busca pela lucidez é um ato de amor de nós a nós mesmos e ao mundo.

Essa matéria foi publicada na revista especial sobre viagens fora do corpo da Revista de Espiritismo Cristão. Aqui o texto está na íntegra, sem os cortes normais de edição de uma revista.

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