A REDE QUE EMBALA OS PESADELOS

- Por Maurício Santini -

Quanto mais o mundo se informatiza e ganha novas tecnologias, quanto mais buscamos alternativas para nos comunicar, menos nos entendemos, muito menos provemos conteúdo e quase nada nos conhecemos de fato.

O mundo segue interligado em rede, conectado a cabos e conexões, porém se desconecta do que é realmente essencial. Fantasia, fantasia, até se perder nas ilusões. Pessoas buscam pessoas freneticamente. Gente procura gente para amar. Tudo isso em fração de segundos, na velocidade das sombras. Todavia, o que os homens esquecem é de acender uma simples luz dentro de si e deixar de depender do outro para serem felizes e estarem em paz.

Eu, você e toda a humanidade queremos alguém para partilhar nossas alegrias e atenuar nossas dores, não? No entanto, todos nós afundamos num mar de lama quando buscamos o outro por necessidade. A tábua de salvação de nada serve porque apodrece e afunda também com o tempo e a maresia. Quem nos salvará então das ondas emocionais que são capazes de nos levar às ilhas tão desertas e repletas de perigos?

Quando conseguimos garimpar alguém com necessidade, com a nossa sede afetiva, nossa fome sensual, todo o nosso sonho de uma vida a dois vira pesadelo com o passar das horas e com os erros tão naturais ao ser humano. O “dormir coladinho” se desgruda, e o belo e o encantado transformam-se num monstro real de tentáculos imperdoáveis. Daí voltamos à solidão, às carências, às baixas auto-estimas, ao medo de ficarmos sós.

Será que nascemos xipófagos um do outro? Por acaso, as crianças precisam namorar para brincar de serem felizes? E os idosos não possuem mais vida quando os amados se vão? O solitário bicho não é capaz de viver alvissareiro na floresta? Todo ser adulto precisa se casar, ter filhos e envelhecer em frente à TV para ser taxado de “feliz”?

Será que este vazio que sentimos se deve única e exclusivamente a ser preenchido pela necessidade urgente do outro?

Sei que dói ficarmos a sós. Enfrentamos o nosso maior inimigo: nós mesmos. Porém, esta busca desenfreada pelo outro nos leva a ficarmos presos a uma rede que embala os nossos próprios pesadelos. É puro engodo achar que a vida só tem graça quando estamos acompanhados por alguém. A solidão é um estado de espírito que pode nascer em meio às multidões. Casados, solteiros, viúvos, adolescentes, adultos e velhos se sentem sozinhos e infelizes. Qual o motivo? È simples: porque não buscam dentro se si a sua melhor companhia.

Isso significa que não precisamos de alguém para alcançar a paz, o amor e a tão almejada felicidade? Não, não mesmo. Desde quando necessidades trazem bem-aventurança? As pessoas somente serão mais íntegras e realizadas quando encararem a presença do outro como dádiva, como presente, como espelho, como oportunidade de crescimento. Assim, quando reconhecemos o momento de cada um, seja ele escuro ou iluminado, saberemos conduzir os nossos relacionamentos sem necessidades. Este é o aprendizado.

Estados de sentimentos são efêmeros, todavia uma porção de felicidade só poderá ser alcançada quando nós nos sentirmos inteiros a sós. A outra metade somos nós mesmos, esquecidos sob os paradigmas cegos dos homens. É muito bom contar com o carinho, a amizade, a força dos outros. Entretanto, temos que nos recordar da hora que nascemos e da hora que vamos partir. Assim, os outros são os outros e só.



São Paulo, 18 de outubro de 2005.

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